Autor Tópico: A cara do equívoco ou da má fé - Andressa Urach e a Pomba-Gira! - Texto  (Lido 319 vezes)

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feliphex

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Assinado: Pai Francisco, no Candomblé Angola: Ngunz'tala (Ex-Pastor evangélico).

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A cara do equívoco ou da má fé!

Em rede social, na manhã de uma quinta-feira, 29 de janeiro deste ano (2015),  uma modelo desabafou, falou sobre religião e afirmou que não deixará de fazer ensaios sensuais. (Andressa Urach declarou que fez pacto com a pomba-gira). 

Vou fazer algumas considerações: primeiro nossas entidades e nossas regras de fé não precisam ser defendidas a qualquer custo. O sagrado sabe se defender, e quando partimos em defesa de algo corremos o risco de caímos pelo ralo do fanatismo ou extremismo, quando nenhum outro pensamento é permitido. Não é isso que buscamos.

Buscamos respeito!
 
É maravilhoso ver alguém se manifestar mesmo que seja contra o que acreditamos, porém, cabe a nós, a cada ser, refletir sobre os fatos, sobre as interpretações e entendimentos que nos cercam, ou seja, é preciso que tenhamos consciência do que cremos e o que nossa fé significa.
 
Sugerir que tudo que viveu de ruim é culpa de uma Pomba-Gira, é necessário considerar algumas possibilidades: ter má fé e prejudicar a fé de muitas pessoas para se engrandecer diante de outro público; ser simplicista e enveredar por um caminho ilusório de querer se eximir da consequência dos seus atos tentando enganar a consciência; ou achar que conseguiu um outro patrão espiritual que vai lhe render mais.
 
Pomba-Gira, ou qualquer outra entidade espiritual ou qualquer outro gênio ou qualquer divindade que seja, não podem tudo diante dos destinos das pessoas e de suas escolhas. A ação do ser sempre vai ser levada em conta!

O ser, Ntu, Muntu, como concebemos no candomblé de Angola é participante da natureza divina, portanto,  suas decisões tem a força de uma ação de uma entidade ou de uma divindade, inclusive com consequências próprias.
 
Fico preocupado com ambas as partes, tanto da cliente (que fique bem claro que, de acordo com sua fala, ela não tinha a Umbanda como regra de fé), e com a liderança de uma casa que serve somente como casa de feitiço sem interesse de despertar o sagrado e o dever de responsabilidade com as decisões pessoais da vida ( se for o caso, pois pode ser um equívoco ou má fé de quem tentou negativar a sua imagem).

E aqui não vai nenhum julgamento sobre nenhuma das partes.
 
Não quero julgar também nem desvalorizar as experiências vividas por nenhuma das partes.
 
Negativar a imagem dela não torna menos grave o que ela falou nem mais responsável a liderança que ela frequentava, que por sinal não conheço e tudo pode não passar de um mal entendido, afinal, a Muntuê/Ori só vê o que consegue ver. Não adianta tirar todos os véus, pois a luz ainda vai encandear quem não está pronto para ver, e não adianta ficar discutindo e tentando convencer ninguém do que não está pronto para ver.

A pessoa enquanto estava lá estava iludida com a forma, com a fama, com o corpo, com o dinheiro... e não mediu as consequências, agora quer achar um culpado.

Que não é novidade as pessoas baterem em nossa porta somente para resolver um problema sem nenhum compromisso e muitos de nós  cobrar o preço, não é. É o mesmo papel que várias igrejas desenvolvem e tudo tem um preço:  tem a campanha tal, a fogueira, o vale do sal, a rosa ungida, o lenço, etc... tudo com o seu preço.

Mas são exceções e não regras.

Um dos ditames do Candomblé e Umbanda, por exemplo, tradição na qual se manifestam as Pomba-Giras como uma linhagem específica de espíritos trabalhadores que juntamente com os Exús de Umbanda agem na manipulação de energias bem humanas, bem nossas, com todas as cargas que nos são peculiar, e que ninguém mais quer trabalhar, mas que é muito importante para o equilíbrio do planeta, é que cada ser é responsável pelos seus atos, pelos seus ritos, pelos seus pedidos, pelas suas bênçãos ou maldições.

Eu até acredito que a Pomba Gira possa ter aceitado o pacto, mas é uma forma de manipular a energia que a sua cliente se propunha. O que falta, talvez, seja o esclarecimento de que na nossa fé não tem conceito de pecado, mas toda ação ou omissão tem consequência e cabe a quem gerou arcar com elas.

Se eu quero direcionar toda energia do sagrado para os bens materiais, para a sexualidade, etc., certo, está tudo certo, mas tem consequência. Se eu quero direcionar para outra área também. Se são boas ou menos boas, é relativo e de acordo com o recebimento e a capacidade de cada mutuê se reconhecer como participante daqueles acontecimentos. Não temos vítimas. Somos coparticipantes.
 
Qual é a diferença de direcionar toda essa energia numa corrente da igreja ou num terreiro para uma área específica? nenhuma. Tudo é magia. Magia é usar de recursos espirituais para atingir o mundo objetivo. Sejam quais forem os recursos.
 
Mas como o cristianismo é aceito como bom pela nossa cultura, não tem problema de jejuar, ofertar, fazer um voto, dar o tudo num corrente da igreja para conseguir um cargo (e alguém perder), agora se for no terreiro, é logo taxado de magia negra. Só existe magia, sem cor.  O que diferencia é só a base de fé e o rito e a índole de cada pessoa.

Agora quando eu uso de toda a força espiritual de maneira inconsequente, violo os limites do corpo físico e da ética social para alcançar um objetivo e isso, claro, tem consequências que eu não queria, é fácil achar um culpado, e claro, se temos que achar um inimigo, que seja um inimigo histórico e um culpado já aceito coletivamente: as tradições, fé, ritos, entidades e divindades do panteão afro, afinal somos uma cultura de brancos, europeus e cristãos que tem como grande trauma histórico e de fé não ter conseguido apagar da memória dos negros escravizados com o respaldo dessa fé, as suas lembranças ancestrais, os seus deuses, as suas crenças, as suas entidades, etc., que se mostram vivas e eficazes, pois dizer que tudo que conseguiu foi pela ação de uma Pomba - Gira, é reconhecer a eficácia dessa entidade, e que os erros cometidos foram pessoais e não da Pomba - Gira, que cumpriu sua parte no trato.
 
Mitigar inclusive os conceitos históricos e dogmas de fé cristãos que dita a moral dessa sociedade hipócrita é muito fácil. É fácil eu dizer para mim mesmo que isso eu posso fazer sem deixar de ser cristão, pois isso não é pecado, de acordo com a justificativa interior que eu dei, porque isso de alguma forma mantém o meu status e garante os bens e fama que tanto quero alcançar e que foram alcançados pela força e uma Pomba - Gira. Em nenhum momento ela renunciou os louros que recebeu, só culpou a Pomba Gira pelas mazelas, que são consequências dos seus atos.
 
Mas é a vida. A grande odisseia de existir neste nível de consciência  e só descobrir mesmo o quanto estávamos equivocados quando for tirado a venda dos olhos e acordarmos nos mundos da verdade.
 
O que apelo é que nossas casas sejam mais conscientes, mas esclarecedoras, não façamos nossas práticas de fé pelo valor que alguém pode dar, e às nem pode, mas se sacrifica por que julga alcançar algo maior.

Se ninguém de nós aceitasse "trabalhos" e não fizesse da magia uma regra de fé ou um ponto de atração para atingir o mundo objetivo, não estaríamos vendo alguém inescrupulosa, descrente, ambiciosa negativar a imagem de uma entidade tão querida para a Umbanda, que pode até manipular e se doar àquela proposta, pois sabe que é o nível vibratório daquele ser, mas que seu objetivo aqui é exatamente nos mostrar a efemeridade da forma e as consequências dos atos e agora está dando gargalhada da ignorância de quem quis usá-la e se embrenha em mais uma cilada espiritual, já que o objetivo, ao que parece, não é se esclarecer, mas manipular todas as forças que conseguir para alcançar os objetivos.

Saravá às Pomba-Giras!

Exu e Pomba-gira refletem a nós mesmo como um espelho, ou melhor, nos refletimos neles e nelas como um espelho.
 
Se eu conheço minhas dores, minhas angustias, minha sombra, minhas trevas, meu ego, meus vícios, minhas paixões e fragilidades e ganâncias, e me proponho a trabalhar sentimentos, pensamentos, palavras e atos e consequências então este conhecimento me torna forte.  Exú e Pomba Gira pode ser um ponto forte para mim.

Se me desconheço ou se camuflo meus sentimentos sem enfrentá-los e sem trabalhar e ter consciência do que realmente sinto e  quero e em consequências disto  reprimo todos os meus temores, desejos, medos, traumas, e ambições, vivendo em uma estrutura mental, psíquica e social hipócrita, atribuindo todo esse negativo que reprimo a um ser externo, e vou associar a um ser que ocupa o meu imaginário e o imaginário social como negativo,  vivo uma hipocrisia! Um sofrimento por não admitir que sou e quero ser o que sou. Deste jeito Exú e Pomba Gira é um ponto fraco no equilíbrio da vida, pois Eles e Elas, como guardiões e guardiãs da Lei, vão evidenciar e proporcionar situações para que tudo venha à tona e eu me dispa diante de mim mesmo e decida que caminho quero tomar, possibilitando, inclusive usá-los como a fonte do que não gosto quando me olho.

É fácil buscar em Exu e Pomba-giras forças e poder para vivenciar o que eu reprimo e se algo não der certo ou gerar dor, atribuo a eles todo o negativo. Então se foi a Pomba - Gira  quem deu essa lição nessa pessoa, tem o meu respeito e espero que essa pessoa alcance o verdadeiro sentido da vida pelos ensinamentos de uma Pomba-Gira, ou então se liberte de vez  assuma de fato o que pretende viver na terra, que terá ajuda do mesmo jeito. Exu e Pomba -Gira não são juízes. O juiz é a consciência divina entronizada em cada ser (Ntu, Muntuê).

E se não foi, que ela tenha sua luz aumentada para  continuar atuando na vida de quem quer crescer, mas não intervir nas consequências dos atos pessoais de cada um/uma, afinal, colher os frutos das sementes que plantou, é uma das mais sábias lições do sagrado e que pode ser feito sem sofrimento nem culpa, mas com consciência, fé e gratidão.

Saravá!



feliphex:

Pomba-gira é uma entidade da Umbanda, religião essencialmente espírita, basicamente foi expulsa do espiritismo tradicional e abraçada pelo candomblé, entidades simplesmente são espíritos de pessoas normais que morreram e hoje se manifestam e são atreladas como guias espirituais pelos praticantes ... você não deveria ser desrespeitoso com seus parentes que já morreram, nem com esses outros, lógico que se já morreram, fica a herança e isso é o que importa?

Achei o texto acima muito enriquecedor, pois com um auto nível e sinceridade explica muita coisa inerente a capacidade sagrada que a religião oferece, o que mal entendido gera controvérsias.

 
"Pouco com Deus é muito, muito sem Deus é nada!"